Como tornar a tecnologia divertida de novo?
Sonhamos por anos em ter algum instrumento dopaminérgico prático, que coubesse no bolso, para nos livrar do tédio, alguma minitelevisão portátil, sei lá! Agora que o temos, nunca mais teremos tédio, temos ansiedade coletiva.
Estou vendo aqui algumas propagandas de notebooks dos anos 90, 2000, 2010… Não me recordo de como era a usabilidade (deveria ser péssima!), mas lembro de como cada minuto em frente ao computador era precioso e deveria ser aproveitado ao máximo, até que algum parente fosse lhe tirar dali para abrir alguma sala de bate-papo ou fazer uma vídeo-chamada a mais pixelada possível.
A tecnologia eletrônica era divertida. Não era o protagonista de nossos dias, como o é hoje; era um convidado ― por isso era legal conviver com ela. Estaríamos com ela pela manhã, e talvez não a veríamos mais pela noite. Hoje a tela está estampado em todos os lugares, é a topmodel, é sobre quem mais se fala.
Acho que parte da estratégia de tentar tornar a tecnologia divertida passa pela ideia de torná-la um evento no cotidiano analógico: a hora de abrir o feed, a hora de ouvir um podcast, a hora de ler um livro digital. É o que tenho tentado fazer.
E você, o que tem feito para tornar a tecnologia divertida de novo?
Eu já tenho uma visão meio (meio? acho que inteiramente, mesmo) pessimista.
Já fui um grande aficionado pela tecnologia. Tive uma carreira profissional de 10 anos atuando como programador. Na realidade, comecei a lidar com programação desde os meus 8 anos de idade, quando ganhei meu primeiro computador. Aos 18 comecei a trabalhar já no ramo. Meu mais recente emprego durou do início de 2019 até cerca de seis meses atrás.
Ao longo desse percurso, pude acompanhar quase que diariamente, de forma técnica, o rumo que a tecnologia tomou.
Como você disse, antes a tecnologia era um complemento, era algo útil, era algo que trazia benefícios. Era algo realmente prazeroso e divertido. Peguei a época do Orkut, do Windows XP, do MSN, da internet discada e depois do ADSL. Foi divertido.
Hoje, no entanto, eu vejo o quão “bleak” e distópica se tornou a realidade, onde, por exemplo, todo mundo é praticamente obrigado a ter celular. Hoje, sair sem celular é como sair sem um documento de identidade. Literalmente, em algumas situações (CNH digital, RG/CPF/não-lembro-a-outra-sigla digital).
Como se não bastasse a obrigação de ter que usar um celular, não há escolha além de Android e iOS. Sim, tem o GrapheneOS e outras alternativas por aí, mas isso é pra quem sabe e tem coragem pra instalar sob risco de brickar o aparelho que não foi nada barato pra comprar (e sem contar que vai invalidar a garantia de fábrica/loja). Ao brasileiro humilde, no geral, a única opção é Android, já que o iOS tende a ser obscenamente caro. Android esse feito e mantido pela Google, que acaba sabendo mais da nossa vida do que nós mesmos.
Saindo da minha digressão, como tornar a tecnologia divertida de novo? Bom, não acho que seja possível tornar a tecnologia atual divertida, porque naturalmente está conectada a espionagem e obrigatoriedade de usá-la. Agora, restaurar tecnologias antigas, por exemplo, restaurar algum 386, um Commodore 64, um ZX Spectrum, pra programar em BASIC e Fortran ou jogar aqueles jogos antigos, será divertido porque trará a nostalgia da época onde a tecnologia tinha sua simplicidade. Ou então, usar tecnologias relativamente atuais como Raspberry PI (até à 4ª versão) ou Orange Pi para mexer com eletrônica ou criar fliperamas, também pode ser divertido. Porque, infelizmente, a tendência da tecnologia “moderna” é ser cada vez mais intrusiva em nossas vidas.